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Prescrição penal e pessoa jurídica

30 de janeiro de 2018 / Por: Beno Brandão

         Considerando que a pessoa jurídica, nos termos da legislação própria, somente é passível de ser responsabilizada criminalmente por infração ao meio ambiente, a prescrição penal a ela atinente refere-se aos delitos contidos na Lei 9506/98.

         A dúvida que se instala, e esse é o ponto deste sintético artigo, é saber qual o prazo prescricional. Poder-se-ia pensar, num raciocínio ligeiro, que a resposta é simples, ou seja, que o prazo está especificado no artigo 109 e incisos do Código Penal. Errado.

         Para se chegar à resposta, há que primeiro se ter em mente dois pontos iniciais.

         O primeiro é saber exatamente qual o tipo de pena que pode ser imposta à pessoa jurídica. A resposta está no art. 21 da Lei 9605/98, ou seja, (i) multa, (ii) restritiva de direitos e (iii) prestação de serviços à comunidade. Vê-se, pois, por questão lógica, que não figura entre as sanções à pessoa jurídica a privação de liberdade.

         Fácil concluir, portanto, que a pessoa jurídica goza de disciplina própria quanto às penas a ela previstas, que diferem daquelas cominadas à pessoa física, isso em função das peculiaridades de sua natureza.

         A segunda observação pertinente é de que a pena restritiva de direitos – quando se tratar de pessoa jurídica – incide diretamente, e não por substituição de pena privativa de liberdade, como ocorre quando se trata de pessoa física (vide art. 7º da Lei 9.605/98). Em contrapartida, no Código Penal as penas restritivas de direitos são aplicadas em substituição às penas privativas de liberdade.

         Assim, não sendo as penas previstas para a pessoa jurídica aplicáveis em substituição às penas privativas de liberdade, a prescrição não pode se regular pelo quantum cominado ou aplicado para essas últimas.

         Fato é que inexiste uma regra específica quanto à prescrição para pena restritiva de direitos (quando é esta aplicada diretamente). Assim sendo, deve-se aplicar a regra do art. 114, I, do Código Penal, que estabelece o prazo de 2 (dois) anos para casos em que a pena de multa for a única cominada ou aplicada. Isso porque em direito penal não se pode lançar da analogia contrária ao réu para tentar incidir a regra do art. 109 do Código Penal. É cediço que somente se admite analogia quando benéfica ao réu (in bonam partem). No direito penal, por força do princípio da legalidade, vedasse analogia contra o réu (in malam partem).

         Esse mesmo raciocínio lógico encontra respaldo na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, como se observa do julgado nos EDcl no AgRg no Recurso Especial 1.230.099 – AM, da 5ª Turma, da Relatoria da Min. Laurita Vaz. Ali restou decidido que “Observando-se o que estabelece o art. 79 da Lei de Crimes ambientais, que prevê a aplicação subsidiária do Código Penal, e sendo certo que a ação penal de que trata esse recurso responsabilizou apenas a pessoa jurídica ora Recorrente pela prática de crime ambiental, condenando-a à pena de prestação de serviços à comunidade, consistente na contribuição, no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), à entidade ambiental legalmente credenciada (fls. 156/175), incide subsidiariamente, na falta de previsão específica, o disposto no art. 114, I, do Código Penal, segundo o qual ´a prescrição da pena de multa ocorrerá em dois anos, quando a multa for a única cominada ou aplicada.´ Isso porque a multa, assim como a prestação de serviços à comunidade são penas não privativas de liberdade, o que justificaria a aplicação do mesmo prazo prescricional excepcionalmente nessa hipótese.”

              Em brilhante artigo Maria Elizabeth Queijo faz profunda abordagem sobre a questão. As conclusões da articulista são precisas e corretas. Ela afirma que “Com relação à prescrição nos delitos ambientais atribuídos à pessoa jurídica na Lei nº 9.605/98, verifica-se as penas restritivas de direitos são aplicadas a ela diretamente, não havendo substituição der pena privativa de liberdade. Não há, porém, no texto legal em foco norma específica que trate da prescrição dessa modalidade de pena. Está-se, pois, diante de lacuna da lei. A própria Lei nº 9.605/98, em seu artigo 79, reconhece a aplicação subsidiária do Código Penal e do Código de Processo Penal, como normas integradoras. O Código Penal, por sua vez, disciplina a prescrição com referência à pena privativa de liberdade (na qual se inclui a das restritivas de direitos substitutivas de pena corporal) (art. 109) e a prescrição da pena pecuniária (art. 114). Vedada, pelo princípio da legalidade, a analogia in malam partem, a integração haverá de ser feita pelo dispositivo que rege a prescrição da pena pecuniária, isoladamente aplicada ou cominada (art. 114, inciso I), posto que descabe como norma integradora o inciso II do artigo 114, que pressupõe a cumulação com pena privativa de liberdade.“ (“Prescrição nos delitos ambientais atribuídos à pessoa jurídica”: artigo de Maria Elizabeth Queijo. Apud Prescrição penal: temas atuais e controvertidos: doutrina e jurisprudência. Vol. 6. Ney Fayet Júnior (Coord.). Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2018, páginas 87-88.)

         Por tudo isso, afirma-se que o prazo prescricional de crimes ambientais, em se tratando de pessoa jurídica, é de dois anos entre marcos interruptivos. Evidentemente, para pessoas físicas, a prescrição regula-se pelo art. 109 e seus incisos do Código Penal.