Quando a Polícia (tanto Civil quanto Federal) toma conhecimento a respeito do cometimento de determinado crime, inicia-se uma série de diligências investigativas a fim de reunir indícios da prática criminosa para embasar uma futura Ação Penal ou, até mesmo, confirmar se realmente existiu o crime, sendo possível o arquivamento do caso ainda em sede de Inquérito, após avaliação do Ministério Público e homologação do Poder Judiciário.
Dentre essas inúmeras diligências realizadas nessa fase preliminar, leva-se em conta a (i) oitiva dos envolvidos, sejam eles vítimas, suspeitos ou testemunhas, que irão narrar o que sabem sobre o fato; bem como (ii) apresentação de provas documentais que demonstrem indícios da prática do delito. Esses atos são determinados pela Autoridade Policial, responsável por presidir o Inquérito; podem as diligências ser requisitadas pelo Ministério Público ou até mesmo sugeridas pela parte noticiante e pelo próprio investigado, na forma do art. 14 do CPP.
A primeira participação do acusado para enfim se defender da acusação contra si surge após o oferecimento da denúncia, onde será aberto prazo para que a defesa do réu apresente a chamada Resposta à Acusação.
Contudo, de uns anos para cá, surgiu uma nova modalidade denominada INVESTIGAÇÃO DEFENSIVA, onde ainda em fase preliminar, ou até mesmo em sede de recurso, poderá a parte desenvolver atividades de natureza investigatória, visando instruir procedimentos judiciais, sem prejuízo de que as provas possam ser reiteradas (reproduzidas) posteriormente em Juízo.
Essa modalidade é assegurada pelo provimento nº 188/2018 da Ordem dos Advogados do Brasil, onde se estabeleceu que os Advogados poderão colher depoimentos, obter dados e informações disponíveis em órgãos públicos ou privados, determinar a elaboração de laudos e exames periciais, bem como realizar reconstituições, ressalvadas as hipóteses de reserva de jurisdição (art. 3º do provimento).
Mas como isso funciona na prática? Pois bem. Um exemplo que podemos citar é a colheita por meio audiovisual de depoimentos de funcionários de determinada empresa, a fim de esclarecer sobre suposta prática criminosa ocorrida na sede, como por exemplo furto mediante fraude. Poderá o advogado informar ao funcionário de que estão sendo coletadas provas de suposto crime ocorrido, e que além das provas documentais, os depoimentos que serão colhidos a partir da investigação feita particularmente poderão servir para embasar pedido de instauração de Inquérito Policial ou mesmo apresentação direta ao Ministério Público; também por outro lado, essa inquirição poderá servir como forma de defesa em face de imputação levantada.
A respeito dessa modalidade de investigação, cita-se, a título de curiosidade, recente julgado proferido pela 5ª Turma do Tribunal Regional da 3ª Região, na Apelação nº 5001789-10.2020.4.03.6181, envolvendo o ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva, onde se decidiu que “o inquérito criminal defensivo é um expediente cujo objetivo é assegurar ao advogado o direito-dever de reunir evidências probatórias que permitam fundamentar as teses favoráveis ao seu assistido”. Neste caso, através da possibilidade de investigação defensiva, foi requerido pelo Advogado o acesso a documentos internos de determinada empresa, importantes para a defesa do seu cliente.
Essa modalidade surge inclusive como um apoio especial em tempos de pandemia. Na incerteza de como serão os dias, diante do surgimento de novas cepas ainda mais transmissíveis do vírus, a investigação defensiva aparece como uma opção de manter o devido processo e a garantia do direito à prova vivos no mundo jurídico.
Além disso, importante considerar que são inúmeros casos que chegam ao conhecimento das Autoridades Policiais todos os dias, o tempo todo. Isso, por vezes, ocasiona natural demora no andamento dos casos. Nesta linha, a investigação defensiva poderá ser uma vantagem no que diz respeito à colheita de elementos com maior frescor, sem deixar que o tempo influencie até mesmo em falsas memórias. Ou seja, acaba proporcionando certa imediatidade entre os atos investigativos e a data em que ocorreram os fatos.
Portanto, essa nova possibilidade de investigação traz uma mudança importante no mundo jurídico. É fato que em todas as áreas há a necessidade de adaptação, visando a modernização, para que não se perca espaço para a tecnologia.
Ter a chance de apresentar as provas devidamente pormenorizadas para a Autoridade Policial e Ministério Público se mostra como verdadeiro avanço para os atuantes da Advocacia. Ainda, consegue-se assegurar direitos fundamentais, tais como o devido processo legal e a paridade de armas.
Importante finalizar lembrando que a Advocacia, segundo nossa Constituição Federal, trata-se de atividade essencial à administração da Justiça (art. 133, CF), sendo indispensáveis para interpretar e garantir os direitos de todo cidadão. Como importante peça nessa função da administração da Justiça, nada mais justo que se dê ao Advogado o direito de também produzir prova, respeitados os limites éticos e processuais, em favor de seu constituinte, seja ele investigado seja ele vítima.
Esse tipo de procedimento já vem sendo por nós utilizado, tudo com vista a garantir a celeridade do caso e a revelação do que de fato ocorreu quanto à determinado caso.